Diante a grande variedade de novidades sendo lançadas a todo instante
no mercado, dificilmente leio mais de um livro de um autor contemporâneo,
afinal, há muita gente interessante para se conhecer. Obviamente, a leitura de uma
única obra não representa a síntese de um escritor, mas não deixa de ser uma
forma preguiçosa de nos escusarmos com nós mesmos de que o autor está lido. Enfim,
desculpas que nos damos para seguir em frente.
Este ano, inusitadamente, um escritor vivo me arrebatou profundamente,
mexendo com um antigo preconceito (ou trauma) que eu trazia desde José de
Alencar: odeio descrições. “Era bom que trocássemos umas ideias sobre o assunto”
mudou isso. De tão empolgado com a forma de escrita, devorei em seguida “Um
Deus passeando pela brisa da tarde”, onde reencontrei outro velho fantasma, com
o qual havia me deparado numa orelha de livro em meus tempos de livreiro: o
termo “duúnviro”.
A riqueza vocabular e narrativa de Mário de Carvalho é realmente
admirável, e suspeito que estes dois livros mencionados ainda são pouco. Este é
um escritor que terei como amigo na cabeceira. Já estou escolhendo o próximo
livro a ler...
Assim, por ensinar que cada
palavra possui sua singularidade e que mesmo as descrições podem ser excelentes
narrativas, Mário de Carvalho recebe minha Láurea este ano de 2014.
[L.M.]
“¿Trabalhar em uma livraria, frequentar diariamente a Biblioteca
Nacional, conhecer pelo prenome a recepcionista do Real Gabinete Português de
Leitura, não seriam indícios de uma desesperada necessidade de acreditar que os
livros fossem capazes de preencher o vazio da existência dentro de mim?
Contudo, afigurava-se o justo revés, pois transbordante em sonhos, eu
contemplava nas histórias a solução dos escritores para dar vazão ao excesso de
alma daqueles que não cabiam em si. Meu pequeno corpo aprisionava minha
imensidão e, em páginas de papel, tencionava evitar a implosão do meu ser, que
naqueles dias tentava se ampliar através de uma pequena anomalia, tal como uma
falange adicional de um novo dedo indicador crescendo entre o polegar e o
indicador já existente em minha mão esquerda.”
(Leandro Müller, in Poemas profundos para náufragos bem sucedidos, Projeto
Rio-Passagens)
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