sexta-feira, novembro 14, 2008

Homenageado 2008 - Roberto Bolaño

Sempre me julguei uma pessoa megalomaníaca. Sempre quis dar passos maiores que minhas longas pernas. Sempre desejei realizar coisas que fossem “as melhores do mundo”. Bolaño conseguiu por duas vezes ser tudo isso que eu sempre almejei. Primeiro em seu “Los Detectives Selvajes”. Depois em “2666”. Duas obras totais, santo graal da literatura.

A boa literatura é aquela que te leva a uma ação, fisíca ou psíquica. Bolaño me obrigou a desviar do caminho pelo qual eu seguia. Queria chegar em um lugar no qual ele já havia chegado há tempos. Agora preciso de novos horizontes.

Por provar que uma vez trilhei um caminho certo (que se pelo qual eu seguisse, chegaria onde Bolaño chegou), e por renovar minhas esperanças de que eu posso encontrar outro bom caminho, Roberto Bolaño recebe minha homenagem em 2008.

«L.M.»

“Finamente chegara o momento que eu tanto esperava. Depois de mais de seis meses recebendo lindas e estranhas declarações de amor, quase anônimas, eu iria conhecer o misterioso remetente. Digo “quase anônimas” porque, apesar de serem assinadas por alguém que se dizia chamar Cláudio, eu não podia supor com mais precisão além da suspeita quem era seu real autor.
Por mais absurdo que pareça, enquanto aguardava, apenas duas coisas passavam por minha cabeça: a) quem teria matado Cesária Tinajero e; b) que meu admirador secreto só poderia ser alguém da livraria Haldora.”

(Leandro Müller, in “28 relatos de abismos sobre si mesmos”, Prólogo.Clarice)

Laureado 2008 - Ernesto Sábato

No capítulo XXV de “O túnel”, podemos ler a seguinte passagem:

"Repare que eu nunca consegui acabar um romance russo. São tão trabalhosos... aparecem milhares de tipos e no final resulta que não são mais que quatro ou cinco. Mas claro, quando você começa a se orientar com um senhor que se chama Alexandre, logo resulta que se chama Sacha e logo Sachka e logo Sachenka, e imediatamente algo grandioso como Alexandre Alexandrovitch Bunine e mais tarde é simplesmente Alexandre Alexandrovitch. Mal você se orienta, já te despistam novamente. Não acaba nunca: cada personagem parece uma família."


Belíssima, mas com um porém: ela nada tem a ver com a história do livro.

Segundo meu amigo Tony Azevedo, alguns tipos de escritores inserem passagens desse tipo em seus romances para ficar rindo de seus leitores. Trata-se de um recurso de pura satisfação pessoal, mas que é responsável para que todo o esforço em escrever um longo romance valha a pena. Simpatizei com a idéia.


Pela liberdade de rirmos de nós mesmos, Sábato, já bem velhinho, recebe os louros de 2008.


«L.M.»



“— Isso me faz lembrar o caso de um escritor que ia de Copacabana para Botafogo e resolveu cortar caminho por dentro do cemitério São João Batista. Chovia uma chuvinha bem fina, mas suficientemente intensa para molhar. Numa daquelas vielas apertadas entre covas, o sujeito escorregou num túmulo de mármore rosa e deu com a cabeça no chão. Porém, antes de morrer — sim, depois ele iria morrer — se arrastou pra fora do cemitério, atravessou a General Polidoro, e ainda entrou por mais um quarteirão bairro adentro, como se estivesse fugindo de algo.

— ¿Sério? ¿E de que ele fugia?

— Alguns disseram que ele fugia do lugar-comum. ¿Sabe como é? Morrer num cemitério, pega super mal para um escritor. Tudo bem que na vida real ainda podemos ver esses tipos de chavões, mas na literatura não... ¡a literatura tem que ser muito maior que vida!

— ¿E o que fazer quando a vida se torna maior que a literatura? — quis saber Letícia, crendo que o amigo teria uma resposta.

— Crie você a ficção, pois as que existem já não lhe servem mais para nada.”

(Leandro Müller, in “Parábola do matemático sem fé e outras funções quadráticas” (Letícia); in Haldora: a literatura e suas almas)